sexta-feira, 30 de julho de 2010

A questão dos que não voltam

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Publicamente, os motivos alegados variam entre a falta de uma reforma política e a inutilidade do mandato parlamentar. Nenhum deles admite que não conseguiria reeleger-se. Outros nomes, como Antonio Palocci e José Eduardo Cardozo, desistiram do mandato, mas não desistiram da política. Vão estar na linha de frente do governo ou da oposição em 2011. Aliás, Antonio Palocci é, de longe, a maior estrela do PT, depois de Lula.

Em declaração dada ao UOL, o líder do PPS na Câmara dos Deputados, Fernando Coruja, alega “desestímulo De acordo com levantamento do analista político Antonio Augusto Queiroz, do DIAP, dos 513 parlamentares que compõem a Câmara dos Deputados, 93 não vão concorrer a qualquer cargo político. De acordo com o DIAP, esse número é muito maior do que o verificado em 2006, quando apenas 15 deputados deixaram de disputar as eleições. O fenômeno já despertou inúmeras matérias e reflexões sobre o fastio político que se abateu sobre quase com o trabalho na Câmara”. Disse ele, ainda, que “a capacidade política do deputado está muito diminuída. O fenômeno acontece internacionalmente e no Brasil. A imprensa, por exemplo, tem mais influência que o Congresso, que está fragilizado. O sistema atual não é eficaz”.

Muitos outros nomes de peso, por razões variadas, não vão estar no Congresso no ano que vem. Fernando Gabeira vai disputar o governo do Rio de Janeiro. Rocha Loures (PR) será candidato a vice-governador no Paraná. Índio da Costa e Michel Temer serão candidatos a vice-presidente. A lista de desfalques é significativa e preocupante. Nem tanto pelas perdas pessoais que o Parlamento vai sofrer. Há muito a qualidade da participação no Congresso vem sendo depreciada. Assim, mais uma onda de desistências não irá mudar muito a cara da Câmara dos Deputados no ano que vem. O que preocupa mais é a crise existencial pela qual passa o Congresso Nacional como instituição.

Tal situação é agravada pela sensação de sucesso que transpira dos números de avaliação do governo. Lula é o presidente mais bem avaliado da história brasileira, e nunca o governo foi tão bem avaliado também. Na outra ponta, os políticos e suas instituições legislativas são muito mal avaliados. O Congresso, mesmo quando faz bem, é mal interpretado, subavaliado ou ignorado.

Em sendo a análise e o discernimento político pedestres, a consequência da má avaliação política é um processo agudo de depauperação da participação política. Simultaneamente, a própria instituição política não reage ao processo, colaborando para agravar, ainda mais, o quadro político. Sem melhoras evidentes – ainda que, na margem, elas estejam acontecendo –, a impressão superficial é a que fica.

No mundo inteiro, o Parlamento vive uma crise institucional. No Brasil, a situação é pior e mais séria pelos seguintes fatos. Temos um Congresso que reflete a diversidade de 27 estados e do DF. Temos um quadro de maciça ignorância política. Temos ainda um grande desprezo das elites pela atividade política. Temos, por fim, um Poder Executivo que, além de mais forte, tem interesse em ter um Legislativo fraco, desinteressado e fisiológico. Enfim, é um quadro grave para a democracia.

Por fim, sem muito lero-lero, muitos que desistem o fazem pelo simples fato de que não teriam votos para voltar. Ainda que as regras e as circunstâncias eleitorais não tenham piorado tanto em comparação com o quadro eleitoral de 2006.

Murillo de Aragão é cientista político

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