A síndrome da censura
Carlos Alberto Di Franco
O mais recente caso de proibição judicial ao trabalho jornalístico — a proibição de que o jornal “Gazeta do Povo”, do Paraná, publique informações sobre investigações abertas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contra o presidente do Tribunal de Justiça do estado, Cleyton Camargo — reacende a síndrome da censura prévia no Brasil.
A liminar garantindo que as notícias sobre as denúncias não fossem publicadas no jornal foi concedida há um mês. O desembargador, no pedido, sustenta que “os fatos em notícia (...) vieram impregnados pelo ranço odioso da mais torpe mentira”. Pediu, ainda, que as reportagens sejam banidas do portal do jornal na internet. Quer dizer: censura prévia multiplataforma. Proíbe-se a sociedade de ter acesso a informação de indiscutível interesse público.
Sem prejuízo do meu sincero respeito pelas decisões do Judiciário, a censura prévia é uma bofetada na democracia. O controle ao jornal é mais um precedente gravíssimo. É importante que a sociedade reaja. Caso contrário, a violência judicial pode se transformar em rotina.
“Nada mais nocivo que a pretensão do Estado de regular a liberdade de expressão, pois o pensamento há de ser livre, essencialmente livre. Liberdade de imprensa concerne a todos e a cada cidadão. Esta garantia básica, que resulta da liberdade de expressão do pensamento, representa um dos pilares em que repousa a ordem democrática.” São palavras do decano do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Celso de Mello, um sensível defensor dos valores democráticos.
O que está em jogo, para além da garantia constitucional da liberdade de imprensa, é o direito que tem a sociedade de ser informada. É difícil imaginar que o Brasil possa superar a gravíssima crise ética, que transformou amplos setores do serviço público num exercício de cinismo e arrogância, sem ampla liberdade de imprensa e de expressão.
Além de inconstitucional, a liminar que censura o trabalho da “Gazeta do Povo” caminha na contramão do anseio de transparência no comportamento dos homens públicos que domina a sociedade brasileira. A experiência demonstra que a escassez de informação tem sido uma aliada da perpetuação da impunidade.
Mas não são apenas decisões judiciais equivocadas, mesmo por pouco tempo, que ameaçam a liberdade de expressão e de imprensa. Preocupa também, e muito, o controle da mídia por grupos com projetos de poder e perfil marcadamente radical e antidemocrático. A democracia cresce quando os meios de comunicação têm trajetórias transparentes. Pode-se concordar ou discordar com a linha editorial das empresas de comunicação, mas há um valor inegociável: a transparência do negócio e o compromisso com valores éticos básicos.
O combate à corrupção e o enquadramento de históricos caciques da vida pública só têm sido possíveis graças à força do binômio da democracia: jornalismo livre e opinião pública informada.
Carlos Alberto Di Franco é diretor do Departamento de Comunicação do Instituto Internacional de Ciência Sociais.
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