QUANDO HÁ SECA NO SERTÃO
SÓ NÃO MORRE A POESIA
Brás Costa
Morre logo a jitirana,
O feijão-de-corda seca,
Morre o milho na boneca,
Devido a seca tirana;
Murcha a flor da umburana
Quando o carão silencia,
Se calam caçote e jia
No fundo do cacimbão.
Quando há seca no sertão
Só não morre a poesia.
Só se vê o chão rachado
Onde existia água e lodo;
Sertanejo perde todo
Algodão que foi plantado;
O caboclo é obrigado
Fazer o que não queria:
Vender por baixa quantia
Dois terços da criação.
Quando há seca no sertão
Só não morre a poesia.
O camponês acanhado
S’inscreve ao “Bolsa Família”;
Chove discurso em Brasília,
Projeto pra todo lado.
Fica tudo engavetado,
Sem chegar onde devia;
Metade em burocracia,
Metade em corrupção.
Quando há seca no sertão
Só não morre a poesia.
E quando a seca se estica
Pintando de cinza as roças,
Fazendo secar as grossas
Folhas da velha oiticica,
Um gato dorme na bica
Por onde a água corria
Depois que a chuva batia
Nas telhas do casarão.
Quando há seca no sertão
Só não morre a poesia.
Só não morre a esperança
Nem a fé do sertanejo.
Vai vivendo de desejo
Enquanto chega a bonança.
O poeta não se cansa,
Pega na viola e cria,
Que até seca e carestia
Lhe servem de inspiração.
Quando há seca no sertão
Só não morre a poesia.
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