sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Poema

Trem da noroeste - Cassiano Ricardo

Olhos oblíquos
pestanas ruivas;
é o homem bíblico
multiplicado
pelo futuro
pelo presente
pelo passado.
E a terra enigma
modela o outro
(ainda criança
que há dentro dele)
à sua imagem
e semelhança.
Porque ele mesmo
cortado ao meio,
ficou lá longe
e entre o que veio
e o que não veio
o azul-atlântico
lava a memória
do que não veio.
Rostos em viagem.
Rostos em série.
Baralho humano.

Novas trombetas
de Jericó.
A hora futura
que Deus escreve
por linhas tortas
no mural rude
da manhã clara,
imprime aos rostos
judeus, lituanos,
sírios e russos
o ensaio vivo
de um mundo só.
Nisto o trem pára.
Que face é aquela
que se debruça
numa janela?

É a face do outro?

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